Como implantar um programa de compliance eficiente

Um compliance eficiente não pode ser medido pela existência de um ultrasofisticado sistema de detecção de red flags, pela importação de técnicas e procedimentos de sucesso em outras empresas ou por um programa que adote o state-of-art dos manuais internos. O que realmente importa é a adequação do programa para atingir a conformidade ética naquela empresa específica, com aquela cultura organizacional que a faz única. Não há compliance de prateleira!

Portanto, o mais importante, antes de qualquer consideração é conhecer a cultura da empresa. Nenhum programa de compliance sério pode ser implantado sem que haja uma extensa pesquisa sobre como os seus executivos, gerentes, funcionários, fornecedores e outros stakeholders veem a si mesmo, a empresa, o negócio, o ambiente organizacional e os riscos que a empresa enfrenta. Algumas vezes a implantação de um programa de integridade eficiente vai esbarrar em uma cultura perversa, individualista e voltada ao resultado a qualquer custo. O mais difícil de tudo, portanto, será mudar essa cultura, mesmo porque seus altos executivos são possivelmente representantes dela. Riscos, estruturas organizacionais e procedimentos são a parte fácil do problema. Mudar uma cultura, isso sim, dá trabalho. E nenhum programa, por si só, é capaz disso. 

O primeiro desafio sempre será o tone at the top, ou, como mais modernamente tem sido enfatizado, conduct at the top. As primeiras entrevistas, portanto, serão com os principais executivos. Eles terão que responder com sinceridade o que desejam com esse programa. Algumas vezes a própria aceitação de implantação de um programa deve ser procedida dessa conversa franca. De que vale malhar ferro frio tentando implantar o que melhor se adequa à empresa, quando esse processo é boicotado pela própria alta direção? 

Melhor para ambos que nem sequer haja a contratação, pois um profissional ou uma empresa que trabalha com conformidade não vai querer ver seu nome envolvido com outra que vai usar de seu trabalho para um compliance de papel. A minha experiência revela que o próximo escândalo poderá respingar nela.

Obviamente, mudar uma cultura não significa dar uma guinada total na empresa. O negócio deve ter continuidade. A mudança cultural é um processo lento e algumas vezes desgastante, mas que pode ser minimizada com inteligência e uso das melhores técnicas de psicologia social. É preciso criar mecanismos que envolvam os stakeholders com os objetivos globais do negócio – pessoas, comunidade, meio ambiente, diversidade e lucro, e nisso a comunicação é de muita importância. Comunicação verbal e não-verbal, pois envolve não somente os meios tradicionais de comunicação interna, mas também decisões claras e firmes, exemplos éticos dos escalões superiores, capacidade e humildade em ouvir todos os envolvidos, um diálogo adulto sobre as decisões tomadas e, o mais difícil, a responsabilização por erros. Poderá até mesmo acontecer uma rotatividade indesejada de pessoal, com o desligamento daqueles mais renitentes ou inadaptados, mas isso se pagará em um prazo relativamente curto.

Assim, antes de mais nada, o início da implantação de um programa de integridade adequado e eficiente deve ser precedida pela pergunta: a empresa realmente deseja isso? A autoanálise honesta de suas motivações deve guiar a resposta de seus dirigentes. Compliance é um assunto sério e um passo definitivo em rumo a um comportamento ético e responsável – se não for para ser assim, melhor não fazer nada, pois uma conformidade para inglês ver pode resultar em danos ainda maiores para a empresa, para o stakeholders e para os próprios profissionais da área.

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