Os riscos, sempre os riscos (da série “Como implantar um programa de compliance eficiente”)

“The economy, stupid” foi um dos três slogans criados em 1992 por John Carvile para a vitoriosa campanha de Bill Clinton para a presidência dos Estados Unidos. Essa foi a principal mensagem daquela disputa presidencial e enfatizou a maior preocupação dos americanos naquele momento. Da mesma forma, se fosse salientar um aspecto importante para a construção de um programa de compliance seria: “the risks, dude”.

No artigo anterior desta série falei do comprometimento da alta direção com o compliance. Na minha mnemônica simplificação dos princípios de um programa de compliance, a que denomino “Os 5 C’s do Compliance” (quem quiser saber mais pode consultar o capítulo 4 do meu livro Compliance Bancário), esse “COMPROMETIMENTO” é a fundação principal para a efetividade do programa. Entretanto, mesmo com a boa vontade de todos os envolvidos, a concepção errônea dos riscos reputacionais de uma empresa, organização ou mesmo de um profissional liberal ou celebridade pode colocar tudo a perder.

Os riscos delimitam claramente as necessidades do programa, tanto horizontalmente, ou seja, as diversas áreas do compliance a serem abordadas, como anticorrupção, antilavagem de dinheiro, prevenção de danos ambientais, prevenção de crimes de ódio, dentre tantas, como verticalmente, ou seja, a profundidade e especificidade das medidas de prevenção em cada área, pois nem todas merecerão a mesma preocupação e alocação de recursos. Enfim, é preciso a “COMPREENSÃO” dos riscos para a construção de um programa eficiente e econômico. Compreensão é, portanto, o segundo “C” de um bom programa.

O levantamento dos riscos de um negócio envolve um trabalho muito específico, construído de modo muito cuidadoso da análise da empresa, de seus stakeholders, do mercado onde atua, de sua localização geográfica, dos seus métodos de trabalho, dos seus produtos e consumidores, dentre tantos outros aspectos, que é impossível ser estabelecido aprioristicamente. Não existe um mapa de risco igual a outro, pois, assim como não existem pessoas idênticas, não existem empresas ou organizações iguais.

Essa etapa de implantação de um programa de conformidade deve ser elaborada com análise cuidadosa de informações das mais diversas fontes, internas e externas, por equipe de consultores de fora da empresa, auxiliados por membros da equipe de compliance atual ou a ser efetivada. A visão externa é muito importante, pois é difícil ver a floresta quando se está no meio dela, acostumado com os acidentes geográficos, as árvores e os caminhos. O malfeito muitas vezes se esconde em rotinas, e o ser humano tem dificuldade de ver perigos ou problemas quando está acostumado com elas.

Mas, assim mesmo como é preciso uma visão externa, é necessário apoio interno efetivo, pois ninguém conhece melhor a realidade que aquele que a vive no dia a dia. Se rotinas podem ser um perigo, destruí-las simplesmente é um erro. Na maior parte das vezes são necessárias pequenas correções para que tudo seja aperfeiçoado. A compreensão envolve também, dessa forma, o aprofundamento do conhecimento da cultura interna, e não é simplesmente jogando tudo pela janela que se constrói efetividade.

Enfim, como na campanha vitoriosa de Bill Clinton, saber o que é necessário enfrentar através da percepção adequada da realidade é o caminho para o sucesso.